Imagine-se nesta situação: João e Matheus, irmãos, receberam na herança de seu falecido pai um apartamento na proporção de 50% para cada um. Após analisarem o mercado, decidiram por efetuar a venda aproveitando a alta de preços na região.
Contudo, para sua surpresa, o Comprador desistiu de comprar o imóvel, alegando que os registros não estavam regulares, visto que João e Matheus ainda não eram os proprietários do imóvel.
Pode parecer estranho, mas o Comprador está correto!
Um dos temas mais complexos da vida civil ocorre com a sucessão. Além de ser um momento muito delicado para os envolvidos sob o ponto de vista emocional, todos os procedimentos a partir do óbito até o efetivo encerramento do processo inventário são envoltos em complexidades que, por vezes, causam ainda mais estresse no convívio daquela entidade familiar.
Dentro na história trazida acima, a complexidade reside nos procedimentos de inventário envolvendo a transmissão de bens imóveis como, por exemplo, o apartamento do falecido pai aos seus filhos.
Nesse contexto, é relevante destacar que a propriedade somente é consolidada a partir do registro do ato de sua aquisição na matrícula do imóvel, conforme estabelece o art. 1.227 do Código Civil: “Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código.”
Embora o referido artigo preveja atos “entre vivos”, a Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73) caminha no mesmo sentido, indicando que o Cartório de Registro de Imóveis deverá registrar os formais de partilha em inventários (art. 167, inciso I, item 25).
Portanto, não resta dúvida sobre a necessidade de registro do formal de partilha perante o registrador imobiliário, sob pena de não ser reconhecida a propriedade dos herdeiros sobre o imóvel, conforme apontou o comprador em nosso exemplo.
Desta forma, expedido o formal de partilha, o herdeiro deverá requerer o seu registro perante o cartório de imóveis competente, efetuando o recolhimento das custas para o ato registral, assim como anexando todos os documentos pertinentes ao processo de inventário. Ao final, concluído o registro, o herdeiro passará à condição de proprietário do imóvel, exercendo todas as faculdades inerentes ao direito de propriedade (usar, fruir e dispor do bem).
Assim, embora o inventário tenha se encerrado, “o jogo só acaba quando termina” (importando a máxima criada no mundo do futebol), visto a obrigatoriedade de registro do formal de partilha na matrícula do imóvel.
Cientes disso, João e Matheus efetuaram o registro do formal de partilha na matrícula imobiliária, passando à condição de proprietários e, então, promovendo a venda do apartamento.
Dra. Claudia Oliveira – Advogada especializada em direito sucessório e imobiliário, atuando tanto na esfera judicial quanto extrajudicial. Sócia fundadora do escritório Gonçalves de Oliveira & Santos.